A primeira vez que ouvi falar de Cláudia Wonder foi em 1986 numa coluna do escritor Caio Fernando Abreu no Estadão. Ele publicou em sua coluna no jornal o artigo “Meu amigo Claudia”, no qual rendeu uma afetuosa homenagem àquela que no palco e na vida era bem assim: uma maravilha, um espanto.
Depois dessa coluna, sempre ouvi histórias sobre a Cláudia. Ela era irreverente acima de qualquer coisa. Não era óbvia, a começar pela escolha do nome. Ela era Marco Antonio Abrão, mas virou Wonder.
Se esperavam dela o amor pelos musicais à Judy Garland, ela apresentava Lou Reed com sua banda Jardins das Delícias. Se a queriam fazendo lipsinck na boate, ela preferia integrar a trupe do lendário diretor de teatro Zé Celso na peça O Homem e o Cavalo. Se a queriam alienada e fútil, ela se mostrava politizada, a favor da democracia no fim da ditatura e ativista dos direitos civis para gays, lésbicas e trans.
Claudia começou sua carreira artística fazendo shows em boates e no teatro. Com participação em mais de dez montagens (algumas delas com o Teatro Oficina), 13 filmes – entre eles, Carandiru – um álbum solo FunkyDiscoFashion (2007), gravado com Edson Cordeiro, além do livro Olhares de Claudia Wonder – Crônicas e Outras Histórias (2008).
Marcou época no lendário clube paulistano Madame Satã, e toda sua irreverência ficou conhecida na noite underground paulistana da década de 80. Entre as concorridas performances apresentadas no “Satã”, não há como esquecer o banho de Claudia, numa banheira de groselha, de onde “espirravam” atitudes e protestos. Tanta ousadia conquistou não só Caio F., como Cazuza, Zé Celso e tantos outros amigos – famosos e não famosos – que se tornaram fãs da artista. “Ela tinha uma voz tênue, rouca, uma roqueira quase sem voz. Mas ela tem a voz e a voz da alma dela é fortíssima”, disse o diretor Zé Celso no documentário de Dácio Pinheiro.
Claudia deixa não só uma herança cultural formidável, mas, sobretudo exemplo de dignidade como bem registrou Caio Fernando Abreu. E esse tipo de herança não se perde. “Esbarraremos” com Claudia pelas esquinas de São Paulo – e em tantas outras por aí – cada vez que a arte prevalecer e a intolerância sucumbir. Disse Zé Celso: “Claudia Wonder não foi, Claudia Wonder é a história dessa cidade ainda”. Divas não morrem.
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