Soube através de um amigo que mora em Cascavel do
suicídio de duas adolescentes na Ponte da Amizade, pra quem não se localiza
bem, é a ponte que liga o Paraguai ao Brasil. Contou-me que elas se jogaram
abraçadas dessa ponte em direção ao Rio Paraná. Coutou-me tb que imediatamente
após serem avisados, o corpo de bombeiros de ambos países saíram em buscas das
meninas, mas que não encontraram nada. É um rio perigoso, com correntezas
violentas, um rio profundo.
Além disso, que já me deixou bastante chocado, me
contou também que estão dizendo por lá e pelas redes sociais que as meninas se
jogaram no rio porque tinham uma relação afetiva, eram namoradas, e que suas
famílias não aceitavam a relação. Aí de chocado fiquei arrasado porque fico
sempre pensando, diante dessas situações, como é que ainda hoje tantas famílias
não aceitam o amor de seus filhos porque julgam que amar alguém do mesmos sexo
seja pecado, erro, anormalidade, doença, crime. E como é que essa pressão ainda
impõe em muitas pessoas um peso tão grande de culpa a ponto de fazê-las não
vislumbrar outra solução que não seja a de por fim a própria vida.
Fiquei pensando, mesmo sem saber nada sobre as
meninas, sem sequer poder compartilhar com elas a dor que sentiram, o medo que
sentiram, a solidão em que se encontravam, se não haveria outra forma de
enfrentar essa dor sem por fim a própria vida.
Alguém vale a dor que a gente sente? O que dizem a
nosso respeito deve ser levado tão a sério a ponto de fazer com a gente se
anule para dar satisfação? Esse ato modifica alguma coisa?
E aí fiquei me imaginando, me colocando no lugar
dessas meninas, adolescentes, provavelmente sozinhas, rodeadas dessa enorme
moral religiosa fundamentalista que produz ódio no lugar do amor, que separa
quando devia juntar, que denigre quando devia compreender.
Não deve ser fácil mesmo enfrentar um bando de santos
espalhados em quase todas as religiões. Os Santos que falam em nome de Jesus,
em nome Deus, em nome de uma Família sagrada e que sabem/podem julgar como se
ocupassem um outro lugar e mais, como se julgar, não fosse passível de
julgamento, porque santificados que são, podem tudo, inclusive, produzir essa
culpa que as meninas carregaram a ponto de se matarem. A culpa que ajudou a
pesar para afundar o corpo das adolescentes.
É, talvez a atitude delas modifique sim alguma coisa:
talvez a família possa, mesmo que tardiamente, é verdade, repensar a sua
posição em relação ao amor que elas sentiam. Talvez possam em algum momento
compreender o que é o amor. Talvez possam, a partir disso, repensar as suas
maneiras de encarar a vida dos outros.
Ou, cheios até a alma de suas religiões-de-ódio julgar
ainda o suicídio, como se ele independente dessa
moral-religiosa-fundamentalista tivesse uma vida própria.
Tenho certeza de que vamos nos envergonhar muito ainda
dessas posições cristalizadas sobre a homossexualidade, assim como nos
envergonhamos hoje de antigos preconceitos. Tenho certeza de que precisaremos
nos explicar um dia, como já foi feito tantas vezes, diante de tanto sofrimento
por alguma coisa que diz respeito, sobretudo, ao privado. Como é que podemos
julgar as formas do amor? Como é que podemos pensar que há uma única maneira
dele se manifestar: a que julgo certa?
Não sei se as meninas puseram fim as suas vidas por
conta disso, mas de qualquer forma, se não fizeram por isso, outros o fazem
todos os dias.
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