domingo, 17 de março de 2013

Viver a diversidade (texto)

Falar sobre a diversidade é relativamente fácil e cada vez mais se ouve falar sobre ela nos dias de hoje. Assim como se fosse coisa simples de entender. De colocar em prática. De vivenciar.
Dizer que o Estado é laico virou quase uma oração, mas respeitar que haja pensamentos diferentes dos meus em relação às religiões é sim um grande obstáculo para podermos viver em paz, em respeito.
Eu, assim como Caetano, não espero pelo dia em que todos os homens concordem, mas penso que é possível diversas harmonias bonitas sem juízo final.
Não posso, apesar de tudo, concordar que se possa falar qualquer coisa em nome da liberdade de expressão ou de culto. Não mesmo. Liberdade de expressão não pode se confundir com desrespeito, com produção de ódio e, sobretudo, com o que "eu acredito" em detrimento da vida do outro.
Por que não posso respeitar outras maneiras de vida?
Não entra na minha cabeça que em nome de Deus se possa excluir. Me parece que são coisas tão distantes e estranhas e opostas falar do amor de Deus e da não-aceitação do outro que me sinto, de fato, cada vez mais distante de certas religiões. De certos religiosos.
Essa história de que tudo é coisa do diabo, de que o comportamento que não seja igual ao meu deve ser dizimado me parece um pensamento tão desrespeitoso, tão pequeno que não poderia estar na cabeça de algumas pessoas, algumas muito amigas e próximas.
As vezes fico pensando que enquanto movo a minha vida para mudar a vida do outro é porque não consigo de fato mudar alguma coisa na minha própria vida. Alguma infelicidade grande que me incomoda e eu a deixo de lado (tomando conta da felicidade do outro que me faz mais infeliz, porque eu gostaria que o outro fosse tão infeliz como eu sou).
Por que o fato de eu ser gay pode afetar a vida de uma amiga com a qual eu não tenha nenhuma intenção sexual? Por que o fato de eu ser evangélico, acreditar nos dogmas dessa religião, me coloca, necessariamente, em oposição a quem tem uma vida, digamos, não-cristã? Eu tenho que impor o meu pensamento ao outro? Ele tem que pensar como eu para que a gente possa conviver? Por que eu não consigo conviver com o diferente? 
Como eu faço então para estar no século XXI, viver em sociedade, criar os meus filhos, mandá-los para a escola sem que eu, minimamente, saiba que o mundo é muito maior do que o quintal da minha casa? Não posso, em nome de uma religião (até mesmo porque são muitas e distintas), negar ao outro seus desejos, seus direitos. Isso não é justo. Isso não pode ser um pensamento cristão. Duvido que Deus aprove isso!!!! Além de que, os direitos dizem respeito à igualdade, isso não é uma escolha, como um credo, isso não tem relação com o particular.
Um pequeno exemplo: sou professor e em minha sala de aula, a deste ano, primeiro ano do curso de letras, tem 51 alunos matriculados. Já os sondei  sobre suas religiões e, em relação aos que se manifestaram, são 5 distintos credos numa mesma sala de aula. Sobre a diversidade sexual, não os sondei, mas já foi possível perceber que há héteros e homossexuais neste mesmo ambiente. Além disso, tenho alunos brancos e pretos em sala de aula. Tenho tb gordos e magros. Altos e baixos. Tímidos e falantes. Muitos jovens e mais velhos. Além, é claro, de todas as outras diferenças ainda não percebidas.
E sempre foi assim. Desde que eu me entendo por gente, lá nos meus anos de escola primária, hoje, ensino fundamental, em minha sala de aula tinha gente de todo o tipo. Mas não era mais tranquilo, era apenas mais silencioso, ou seja, as pessoas fingiam ser todas iguais para produzir um certo-mesmo-padrão. Acontece que os tempos são outros: negros, mulheres, homossexuais querem poder ocupar seus espaços e isso tem incomodado mais do que devia.
A gente devia se incomodar com gente desonesta, mesquinha, falsa, caluniadora, mentirosa, hipócrita, mas isso, não tem nada a ver com orientação sexual, cor ou religião. Isso tem a ver com formação. E é outra história.
O meu problema não são os evangélicos, os católicos, ou os sejam lá quais forem as religiões, o meu problema é com o fundamentalismo. O meu problema é com a "intolerância", com o se colocar em uma posição de normal, de superior em relação ao outro. E isso não é pouco. Isso me afeta. Isso é fascismo.
Não posso entender que o meu comportamento tenha que ser O modelo para o comportamento do meu vizinho, da minha amiga lá do Rio. Não dá para eu engolir que eu só possa ser amigo de certas pessoas se elas pensarem ou forem como eu. Pra mim isso é inaceitável.
Uma pena que haja tanta resistência para uma coisa tão simples: convivência. Deixar que o outro possa ser quem ele é.
A religião não pode ser um fóssil, ela não pode ser/estar independente da sociedade. Não pode se voltar para ela mesma. A religião não é nada sem a sociedade. Ela não existe. O religioso que se comporta assim, muito provavelmente, fará parte das estatísticas de quem morreu de parada histórica. O mundo se movimento e não ser capaz de acompanhá-lo é atirar no próprio pé.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Da Série Contos Mínimos

"Há sempre um sorriso a nossa espera". Lembrei-me imediatamente dessa frase, repetida à exaustão por meu pai, que me havia deixado não fazia muito tempo. Assim que as lágrimas secaram eu repensei no rumo desejado para a minha vida: eu sabia apenas o que não queria mais.

O uso reto do corpo (sobre a eleição de Feliciano como presidente da CDHM) - Contardo Calligaris



Em tese, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) luta para que cada cidadão e cada grupo de cidadãos possam exercer plenamente sua diferença (claro, à condição de que essa diferença não atrapalhe a liberdade dos outros).
Parece lógico que a comissão seja presidida por um espírito libertário. Isso não exclui pastores, padres, imames e moralistas rigorosos, à condição de que, por cultura, experiência de vida e qualidades morais excepcionais, eles saibam colocar a liberdade dos outros antes de suas próprias convicções.
Esse não parece ser o caso do deputado Marco Feliciano (PSC-SP), pastor evangélico, que acaba de ser eleito presidente da CDHM. Na notável série de suas declarações boçais citadas nestes dias, minhas preferidas são: 1) "Os africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé. Isso é fato."; e 2) "O reto não foi feito para ser penetrado -não sou contra o homossexual, sou contra o ato homossexual."
1) No texto bíblico que eu li, Cam zombou do pai Noé, o qual condenou Cam e sua descendência à servidão. Mais tarde, os defensores da escravatura decidiram que Cam era o antepassado dos africanos e se serviram dessa história para justificar a posse e o comércio de escravos.
Terminar a evocação de um relato bíblico com um "isso é fato" já é ingênuo. Terminar da mesma forma a revisão do relato bíblico proposta pelos defensores da escravatura é para além de ridículo.
Feliciano, formado em teologia, talvez leia a Bíblia no grego da Septuaginta e no hebraico do texto massorético. Eu me viro em grego antigo, mas, por hábito, leio a Bíblia no latim de São Jerônimo ou no inglês do rei James. Será que ele tem acesso a fontes que eu ignoro?
2) Cada deputado recebe uma verba considerável para que possa opinar com conhecimento de causa. Mas Feliciano parece não saber que uma porcentagem substancial de homossexuais não gosta de sexo anal, enquanto, inversamente, o sexo anal faz parte das fantasias e das práticas sexuais de muitos homens e mulheres heterossexuais. Isso, sem entrar no vasto capítulo das penetrações (fantasiadas ou reais, solitárias ou não) com objetos inanimados ou outras partes do corpo.
O deputado Feliciano poderia se corrigir, generalizando: "hétero ou homo, tanto faz: o reto não foi feito para ser penetrado". Eu entenderia melhor.
Mesmo assim, fico curioso. Será que, para o deputado Feliciano, as mãos foram feitas para carícias, solitárias ou não, recíprocas ou não? E como fica a boca? Sem pensar muito longe, será que ela foi feita para ser invadida pela língua do parceiro ou da parceira?
O deputado Feliciano poderia se entrincheirar atrás da ideia de que tudo o que não serve para a reprodução deveria ser banido do sexo. É uma opinião difícil de ser sustentada, pois, justamente, somos os únicos mamíferos cujo desejo sexual não depende nem um pouco da fertilidade da fêmea e, portanto, da reprodução. Mas é uma opinião respeitável e não incompatível com a presidência da CDHM, à condição de ser, para o próprio Feliciano, apenas uma opinião.
Em outras palavras, o deputado Feliciano tem o direito de ser impenetrável, para maior glória divina. Que diga, então, que SEU reto não foi feito para ser penetrado, e ninguém protestará.
Imaginemos que eu faça parte de um culto satânico que só permite atos sexuais que desprezem a finalidade reprodutiva, e isso justamente para contrariar um eventual plano divino. Ou imaginemos que eu pense, simplesmente, que o melhor uso do meu corpo é o prazer e o gozo.
Será que Marco Feliciano, presidente da CDHM, vai defender meus direitos? Se a resposta não for um sim retumbante, a CDHM deve trocar de presidente.
Agora, quem colocou o deputado Feliciano na presidência da CDHM? Seis deputados se retiraram assim que Feliciano foi eleito; entre eles, Domingos Dutra (PT), Luiza Erundina (PSB) e Jean Wyllys (PSOL). Mas, apesar do gesto dos seis, quem entregou a comissão ao PSC e a Feliciano foi a base aliada do governo.
A presidente Dilma disse que, nas eleições, "a gente faz o diabo" --ou seja, qualquer aliança vale para ganhar. De fato, nas eleições, a maioria de nossos políticos supostamente laicos e progressistas não fazem o diabo, fazem o santinho. Para conquistar votos fundamentalistas, beijam anéis e frequentam cultos; no fim, eles recompensam, de alguma forma. Por exemplo, com comissões.

sábado, 9 de março de 2013

Nem tudo que é trabalho é chato (texto)

Outra vez é sábado. Não sei se gosto ou se me assusto com o tempo que não me deixa percebê-lo de imediato. Semana passada quando me dei conta era sexta-feira, mas eu vivendo como se fosse quinta (tudo bem, um diazinho não é lá para se preocupar tanto).
Ontem, estava arrasado de tanto cansaço. Dormi com a tv ligada e acordei durante a madrugado com alguém conversando no quarto, era Jodie Foster. Não faço ideia de que horas eram. Apenas me situei e desliguei a tv. O bom disso tudo foi acordar tarde hoje.
Queria mesmo ter planos para descansar de verdade. Nem parece que as férias acabaram de acontecer. Me sinto sempre naquele instante de precisar fazer alguma coisa: tem muito acontecendo até final de março e preciso dar conta disso. Ontem terminei a leitura de uma dissertação, hoje inicio a outra.
Entre uma dissertação e outra, tenho concursos, provas, aulas, academus, tudo isso solicitando mais tempo do que eu gostaria de doar. Nem tudo é trabalho, é claro. Ou, nem tudo que é trabalho é chato. Não mesmo.
Tenho me divertido nas aulas no primeiro ano. Os alunos começam a se soltar. Isso é bom. Ler tb é bom. E estar em contato com alguns colegas do trabalho tb. Queria, de verdade, ter mais vontade de sair, mas não vejo a menor graça nos ambientes barulhentos ou nos assuntos intermináveis. Sinto saudades dos meus amigos de Curitiba, do Rio, de São Paulo, de Rondon, mas sei tb que se eu estivesse em um desses lugares ia aproveitar para ficar bem quieto. Na minha. Bem, acordar descansado me fez ter vontade de passar aqui para algumas linhas. É bom começar o dia assim. vai ser um bom dia! Bom Dia!!!!
 


quinta-feira, 7 de março de 2013

Sobre a eleição do Pastor Marco Feliciano para presidente da Comissão de Direiros Humanos

O pastor comprovadamente racista Marco Feliciano foi eleito (a portas fechadas e com seguranças para impedir que o povo ocupasse o espaço onde deveria se sentir representado) presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias. 
Ontem, dia 6 de março, as manifestações contrárias à indicação do nome do pastor para presidir a Comissão conseguiram adiar a votação. Conseguiram apenas adiá-la.
A sua eleição resultou de uma manobra política da bancada evangélica (PSC - apoiado pelos partidos PP, PMDB e PSDB) para, certamente, dar continuidade às violências de todas as ordens contra as minorias no Brasil.
É lamentável que tudo isso aconteça e que nada se possa fazer contra a indicação e posse do pastor. Sinto uma mistura de vergonha e de horror diante desse fato. Vergonha porque considero que um fundamentalista não deveria ocupar sequer a função de síndico de um prédio, que dizer de Presidente de uma Comissão tão importante para as Minorias. Horror porque a sua eleição significa que partidos de direita (e tudo de pior que isso pode significar: intolerância) têm ocupado espaços importantes no atual governo.
Alguns (poucos) deputados insatisfeitos com a eleição do pastor se retiraram em protesto.
Mas existe um ditado popular que diz muito sobre isso: "Se um dia é da caça o outro é do caçador". Estou de luto pelos Direitos Humanos, e continuo na luta pelos Direitos Humanos.

Solidão na velhice...

A solidão na velhice é uma experiência profundamente marcada pela complexidade da existência humana. Com o passar dos anos, os vínculos soci...