quarta-feira, 2 de abril de 2014

Carta pra minha mãe

Sonhei contigo mais uma vez, como sempre tem acontecido desde que vc morreu. Isso não é mesmo uma novidade. Dessa vez, ao contrário de todas as outras, nós conversávamos mesmo sabendo que vc havia morrido. Acordei por conta de algum barulho aqui em casa, mas tive tempo de ouvir a sua resposta sobre uma pergunta feita por mim se (não me lembro do que se tratava) tinha acontecido antes ou depois da sua morte. Naturalmente vc me respondeu que depois de ter morrido. Pena eu não me lembrar do assunto.
Antes, os meus sonhos contigo eram quase todos aflitivos. Eu acordava assustado, depois ficava triste porque me dava conta de que tinha sido um sonho e que vc estava morta. Dessa vez não foi assim. Acho que pelo fato de estarmos conversando "naturalmente", como disse, sobre outras coisas apesar da morte.
Os sonhos são incríveis! São as únicas possibilidades de sentirmos verdadeiramente a presença do outro apesar de tudo: do tempo, da vida.
Nesta semana, fiquei em muitos momentos pensando, por conta dos 50 anos do Golpe Militar, na senhora. Me lembrei de, eu havia me esquecido completamente disso, que havia eleições no Brasil durante a ditadura militar. E que eu sempre ia contigo votar. Lembrei-me de que a senhora votava no Nelson Carneiro e que tb votava num candidato chamado Carrasco, ambos eram do MDB. Lembrei-me tb de outras conversas sobre essas eleições, da senhora me explicar que votava no MDB porque o outro partido era ligado ao governo.
Dizer que eu sinto saudades é chover no molhado...nunca mais vou deixar de sentir: a saudade é essa impossibilidade de poder lembrar juntos dessas nossas histórias. Eu queria muito poder conversar contigo sobre isso.
Ah, lembrei tb durante essa semana de vc me contar sobre o Golpe e me dizer que não sabia muito bem o que estava acontecendo durante algum tempo. Dizer que meu pai fazia reuniões em casa. Dizer que sabia que alguma coisa estava fora do normal, mas não explicar o que era. Seria muito bom poder conversar hoje tb sobre isso, mas não vai dar, né? Eu vou dormir em pouco tempo e já é tarde para ligar.
Olha, queria muito poder te dar/receber um abraço bem apertado, daqueles que trocávamos quando eu chegava ou ia embora, isso antes de vc ficar doente. Depois da doença tudo tinha que ser com o maior cuidado, vc parecia que ia quebrar ao meio se eu fizesse alguma força. Te amo pra sempre.

Um comentário:

  1. Alex, é muito difícil dizer alguma coisa pra te aliviar dessa dor, até porque acho que não existe. SÓ QUERO Q VC SAIBA Q ESTAEREI SEMPRE A DISPOSIÇÃO PRA VC.

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