quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Das coisas que não acontecem apenas nas crônicas de Fernando Sabino

Comprei um carro. Isso não seria nada demais se apesar disso eu não soubesse dirigir. Bem, não é exatamente isso, ou melhor, exatamente assim. Vou me explicar.
Faz uns 20 anos que tirei carteira de motorista e desde então eu sempre tive motocicletas. Sempre não, mas desde que tive algum meio de transporte próprio, tive moto. Nunca achei que um dia eu gostaria de ter um carro. Nunca mesmo. Mas a gente quando acha que definitivamente nunca vai querer alguma coisa, não imagina (nunca) que a gente não vai ser a mesma pessoa para sempre. E isso acontece eventualmente. Aquilo que era nunca passou, no último ano, a frequentar a minha vontade.
E assim comecei a cogitar a possibilidade de comprar um carro. Bem, procuro daqui e dali até que encontro um carro possível. Não o desejável, mas, como eu disse, o possível: um carro usado, preto, 2013.
Uma amiga me ajuda a decidir por ele. Assim, faço as contas e acho (que medo!) que é possível comprá-lo. Carro comprado, preciso levá-lo pra casa. Mas como fazê-lo? Essa mesma amiga, agora responsável por mais esta decisão (quando resolvi comprar uma moto bem grande e potente, ela tb me ajudou a decidir), resolveu a questão antes mesmo que ela virasse um problema. Trouxe e colocou na minha vaga (de garagem) o carro novo.
No entanto, continuo a viver sem ele, já que me falta coragem para dirigi-lo. Bem, como sou mais prudente do que medroso (é assim que me vejo), resolvo fazer umas aulas numa autoescola aqui bem perto de casa. Faço cinco aula e me acho ainda inseguro para sair por aí com meu (novo) carro. Faço mais 6 e pronto. Numa manhã decido dar uma voltinha aqui mesmo por perto de casa para saber se sozinho consigo dar conta desse monstro de quadro rodas.
Primeira luta, tirar o carro da garagem. O maior medo é o de bater nos carros ao lado. Com todo cuidado do mundo e sem qualquer noção de espaço, velocidade faço em 10 minutos (isso mesmo, dez minutos de sofrimento) essa tarefa que minha vizinha não leva sequer 2 para realizar.
Num espaço de cinco metros (da minha garagem ao portão de saída), o carro morre umas 3 vezes. Natural, alguns amigos dizem. É assim mesmo, outros afirmam. Mas só eu sei o sofrimento que isso causa. A insegurança que isso agrega a minha nova função de motorista.
Carro na rua, vou eu para o desconhecido. A cada metro rememorando os ensinamentos dos meus professores. Primeira quadra superada. Mais a frente um sinal de trânsito, preciso parar. O problema não é parar e retomar com um carro atrás e a sensação de que eu estou paralisando o mundo, atrapalhando o tráfego.
É claro que o carro morre, é claro que ligo o sinal de alerta porque não consigo sair do lugar. Resolvo nem olhar pelo retrovisor, não quero saber a quantas não andam os carros atrás de mim.
Ufa, consigo dar a partida! Mais a frente uma curva, uma ladeira, um outro sinal, uma placa de rua preferencial, uma descida (adoro descidas!), oito quadras superadas e, finalmente, outra vez o meu portão de (agora) entrada. O carro diante dessa superação, morre outra vez. Mas quem se importa? Estou sozinho tentando entrar em casa.
Aperto o dispositivo e o portão se abre. Entro e, pra minha sorte, sem carros vizinhos. Coloco o carro na minha vaga como se tivesse feito isso desde sempre. Saio do carro e o ombro, as pernas, os braços doem como se sempre tivessem doído desse jeito. 
Menos um medo pra hoje.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Da Série: Contos Mínimos

Resultado de imagem para psicóticoEle era puro destino de sua mãe. Ele não se pensava. A mãe se apropriava dos seus atos, de suas palavras e até dos seus pensamentos. Ela falava do seu lugar e em seu nome para explicá-lo a si mesmo. Ela não o ouvia para saber o que ele pensava, pois ele não pensava senão aquilo que ela colocava para que ele pensasse.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Da Série: Contos Mínimos

Era tanto o desejo de ouvir outra vez a voz da minha mãe (ou o medo de não ouvi-la outra vez) que acabei me esquecendo de dizer tudo o que eu sabia em todas as línguas possíveis. Acabei falando apenas a língua dela.

sábado, 16 de julho de 2016

Da Série: Contos Mínimos

Nem sempre aquele sorriso estampado nas suas fotografias significava felicidade e alegria. Durante algum tempo, aquele riso branco, largo e feliz era apenas da boca pra fora, água morna, dia nublado, piada sem sentido.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Da Série: Contos Mínimos

Ele olhava apenas para o próprio umbigo e não era capaz de enxergar nada que se passava a um palmo do seu nariz.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Da Série: Contos Mínimos

A gente se leva pra onde a gente vai. Pouco importa se Rio de Janeiro ou Marechal Rondon, se Barcelona ou Cascavel. Tem gente que nasce pra ser feliz e tem gente que não vê a felicidade mesmo quando ela está.

domingo, 3 de julho de 2016

Da Série: Contos Mínimos

Onde foi? De que maneira? Quando? Com quem? A partir do quê? Eu ficava neste lugar das perguntas sem respostas. No lugar da repetição. Das falsas impressões sobre mim. E a vida lá fora corria solta.

Solidão na velhice...

A solidão na velhice é uma experiência profundamente marcada pela complexidade da existência humana. Com o passar dos anos, os vínculos soci...