segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Envelheço na cidade

Hoje, na fila do mercado, uma senhora me convidou a passar para a fila dos idosos. Por alguns segundos, fiquei entre o espanto e o riso: será que já estou com essa marca no rosto, nos gestos, no jeito de esperar? Entrei, claro, mas saí dali com uma pergunta que não me largou: o que significa envelhecer em meio ao barulho e à pressa da cidade?

A cidade nos mede o tempo de outra maneira. Cada esquina é uma lembrança, cada rua guarda uma versão de nós mesmos que já não existe. E, de repente, a fila preferencial deixa de ser uma previsão distante para se tornar realidade concreta: um espaço que nos é cedido, não pela gentileza da pressa, mas pelo reconhecimento da passagem do tempo.

Envelhecer na cidade é aprender a ocupar esse espaço novo. Não como concessão, mas como direito. É olhar para os muros grafitados, para os ônibus lotados e para os jovens que correm sem parar e perceber que já estivemos ali, que ainda estamos, mas de outro modo. É continuar caminhando entre vitrines e semáforos, sabendo que o corpo desacelera, mas que a memória se expande.

Na verdade, talvez envelhecer na cidade seja justamente isso: deixar-se atravessar por ela de outro jeito. Em vez de lutar contra a pressa, acolher a pausa; em vez de se perder na multidão, descobrir novas formas de presença. Porque se há algo que a cidade nos ensina, com todas as suas filas, ruídos e surpresas, é que o tempo não é inimigo, mas companheiro de percurso.

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