terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Como se fosse a primeira vez (texto)

Chove desde que o mundo é mundo, mas a chuva sempre nos pega desprevenidos. Não falo na chuva catastrófica como a que tem nos flagelado, mas na chuva comum. Na chuva que deveria fazer parte das expectativas normais de qualquer um que não vive num deserto. Que não deveria exigir qualquer alteração no seu cotidiano fora a necessidade de usar guarda-chuvas e o cuidado de evitar goteiras e poças. E, no entanto, todas as vezes que chove nossas vidas são transtornadas como se fosse a primeira vez. Meu Deus, o que é isso? Água caindo do céu?! Com chuva todo o mundo se confunde, como se não houvesse precedentes. Com chuva o caos do trânsito vira um pavor, embora só seja o caos de sempre com água em cima.
O descaso que causa as tragédias quando a chuva é catastrófica é um corolário dessa surpresa sempre repetida. A imprevidência dos que constroem em áreas de risco ou a negligência dos que permitem a construção em áreas de risco vem da mesma recusa de ver o óbvio. A chuva é uma obviedade, não é uma novidade. A chuva anômala, catastrófica, também, pois temos uma longa história de tragédias como as destes dias. Mas a reação é sempre de incredulidade, nunca se reconhece o óbvio.
O problema do Brasil não é que as coisas não tenham precedentes. Há precedentes para tudo que nos aflige. O problema é que os precedentes não nos ensinam nada. Assim continuaremos reclamando que os esgotos pluviais não dão conta das grandes chuvaradas e precisam ser refeitos, até a inundação regredir e não se falar mais nisso. Continuaremos protestando contra construções em áreas perigosas até os deslizamentos pararem e o tempo melhorar, e esquecermos. E cada tragédia, como cada dia de chuva, será sempre como se fosse a primeira vez.
REPARAÇÃO
Alguém com tempo e curiosidade suficientes poderia calcular de quanto seria o montante se cada família de vítimas da imprevidência e da negligência dos governos – do esgoto não refeito, da encosta não adequadamente escorada, da estrada não duplicada ou não construída – responsabilizasse judicialmente Estados e União e exigisse reparação. Não precisaria nem ser as vítimas de todos os tempos, só de um ano bastaria. O custo seria maior do que o necessário para fazer as obras.
(Luis Fernando Veríssimo)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

1º Ano do Blog (texto)

O Blog fez um ano e não me dei conta. Na minha infalível memória para datas (homens não têm essa região cerebral desenvolvida), o primeiro ano seria comemorado em 24 de janeiro. Não era bem assim. Fiz um ano de Blog no dia 24 de dezembro! E como não sou tão cara de pau assim, resolvi não ligar me desculpando pelo esquecimento.
De qualquer forma, não queria que essa data passasse assim, em branco, e aí resolvi registrar aqui o primeiro aniversário: preciso dizer que é bacana a experiência de escrever (sabe-se lá para quem) diariamente sobre diversos assuntos (a minha experiência de escrita era, nos últimos anos, estritamente acadêmica); depois, e aos poucos, a gente fica sabendo que algumas pessoas passam por aqui e leem o que está escrito; mais adiante deixam recados, comentários. É uma grande comunidade virtual, Sem fronteiras (Bem que a Tim podia me patrocinar!!!).
Preciso ainda escrever que conheci pessoas especiais através dessa brincadeira. Não vou citar nomes porque posso parecer injusto. Fiz amigos.
Passei por momentos complicados no ano passado, principalmente com a perda de minha mãe obtive aqui apoio dessas pessoas. Escrever nesse momento, quase eterno, me tirou da beira do vulcão em atividade.
Já escrevi sobre quase tudo que me interessa: sexualidade, música, livros, comidas (não necessariamente nesta ordem). Em 2009 foram 421 pequenos posts (tem de tudo): declaração de amor, brigas com alunos, desabafo, homenagens, impressões de viagens, poesias, textos estranhos, contos, recados, coisas bizarras, fofocas, letras de música, notícias nacionais e internacionais, política, impressões pessoais diversas.
O mais importante foram os encontros que se fizeram (mesmo se desencontros). Queria agradecer mesmo a três grandes amigos sempre presentes (e em nome deles agradecer, por deslizamento, aos demais que passa(ra)m por aqui em algum momento): Fátima, Cris e Luiz. São pessoas doces, atenciosas, preocupadas, divertidas e cheias de paciência. Obrigado pelos e-mails, pelos textos, pelas preces, pelos telefonemas, pelos seus blogs.
Preciso ainda escrever sobre o primeiro comentário deixado (o que a gente nunca esquece). Foi no dia 25 de janeiro no post Dias sim, ele foi deixado pela Joana. Acho que ela nunca mais apareceu. Que pena! E o primeiro a seguir o Blog (me deixando preocupado) Juan Antonio do Blog Fotos de Barcelona.
A ideia de fazer um blog surgiu após a leitura do blog de um grande amigo (Alexandre Reis). Aí fiquei pensando, pensando se daria conta, primeiro de colocar um blog no mar, depois, se teria fôlego para escrever, e ainda, se teria sobre o que postar.
Remar
, remar, remar, navegar impreciso por mares nunca d'antes navegados.
Sem a primeira remada não se atravessa o rio. Não tenho medo de águas. Bem ao contrário, apesar de capricórnio, gosto muito de aquário.
É isso! Um grande beijo, muitos abraços apertados, obrigado pelos comentários, pelas visitas, enfim, pelo incentivo.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Hanami - Cerejeiras em flor (filme)

Decidi hoje que não faço mais resenhas de filmes. Registro apenas aqui que assisti e pronto. Talvez eu escreva um pequeno texto sobre a impressão que ele me causou e nada mais.
Li um dia desses 30 resenhas (em diversos blogs) sobre o filme Avatar e achei bem chato ler a mesma coisa trinta vezes. Não quero causar a mesma impressão (ou melhor, não quero causar mais a mesma impressão)!
Depois desse filme fiquei pensado sobre a imperfeição humana. Somos imperfeitos. É claro! E quando atribuímos a nós essas imperfeições é apenas para nos desculpar dessas características. Somos arrogantes, impacientes, invejosos, mentirosos, prepotentes. E além disso tudo, como se fosse pouco, nos achamos eternos.
A proximidade consciente da morte
(nossa ou de alguém que amamos) talvez nos dê um pouco de sabedoria. Tb passageira.
A flor da cerejeira surge como mágica e se desfaz da mesma maneira.

Tua (CD)

Maria Bethânia gravou dois CD´s em 2009 (Encanteria e Tua). Eu podia comprar apenas um. Não tinha qualquer critério. Os dois estavam ali, à disposição. Escolhi Tua, assim como se escolhe uma camiseta, pela estampa. Apenas pela cara. Ouvi dizer que quem vê cara, não vê coração. Não funcionou dessa vez. A não ser que Encanteria seja o top do top, o creme do creme.
Já no primeiro acorde do CD (É o amor outra vez), me apaixonei: voz, música, letra, enfim, impecável. A cada música (são 11 faixas - todas inéditas) me surpreendia com a qualidade das composições.
O cuidado com o CD é marca registrada da maior intérprete (na minha opinião, é claro) da música brasileira. Não sei se a indústria da música está mesmo em baixa (acabei de ler no Globo que nos E.U.A. as músicas, em 2009, venderam menos que no ano anterior), sei apenas que música é um grande investimento: alegra o dia, nos leva para lugares outros, ameniza as dores, afaga a saudade.
Tua é composição de Adriana Calcanhotto, mas tem Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, Roque ferreira, Jorge Vercilo e J. velosso, César Mendes e Arnaldo Antunes, Moacyr Luz e Aldir Blanc, Saul Barbosa e Jorge Portugal, Bill Farr, Márcio Valverde e Nélio Rosa, Chico César e Paulinho Moska, Mauro Duarte, Roberto Mendes e Capinam. Não precisa mais nada.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Caras & Bocas - Cássio e André (texto)

Ontem, último capítulo da novela Caras & Bocas (já postei alguns comentários sobre ela), bastantante satisfatório! Como sempre, casamentos. Muitos casamentos. E praqueles que não se casam, um par, em potencial, para que não se sintam sozinhos e infelizes. É claro que isso não tem nada a ver com a novela, mas com o nosso imaginário em torno do que seja felicidade ("É impossível ser feliz sozinho", cantamos muitas vezes esse verso): até os macacos casaram-se.
Mas um casal (?) me interessa, particularmente, na trama: Cássio e André. Aquele era gay assumido, encontrou uma mulher e se apaixonou. Tranquilo. Este, hétero assumido e aos poucos foi nos dando pistas de que estava interessado no Cássio.
O tema, a homossexualidade, é tão caro para a sociedade que sequer se pode falar sobre ele em alguns horários na TV aberta. A cena em que, supostamente, André conta para a sua família sobre a sua orientação sexual é cortada depois que ele diz que precisa dizer algo sério para todos (quando alguém precisa contar algo sério, pode acreditar, aí tem.). Quando a cena volta, ele já contou e recebe da irmã e cunhado abraços acompanhados da frase: "Parabéns pela sua coragem!". Sua mãe (a mais arredia em torno da sexualidade de André) tb o abraça, mas foge um pouco do assunto convidando-o para um sorvete (estratégia bem bolada e divertida para reforçar e suavizar a questão. Gostei! Estamos num horário das 19h.)
Pode parecer fixação eu abordar tanto esse tema aqui, e é mesmo! É uma maneira de tentar entender o porquê de ainda (e eu sei bem os motivos) em 2010 estarmos tão presos a (pré)conceitos tão século XIX. É claro que as mudanças tb fazem parte dessa observação: imagine uma relação (?) homossexual com final feliz numa novela desse horário?
Mas um silêncio bastante presente insiste em ecoar sentidos por aí.
Num comentário de um post, a Fátima, amiga do Blog Viver é afinar os instrumentos, escreveu sobre uma nova geração que anda surgindo aí, a de sua filha. Menos preocupada, pelo menos em tese, com a vida privada, com os desejos dos outros, com a orientação sexual de cada um. Bom sinal, tb em tese, para as possíveis mudanças em torno do tema. Que venha a próxima geração!!!!


sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Portugal fazendo História (texto)

Deu no Globo.com: O Parlamento de Portugal aprovou nesta sexta-feira (8) uma proposição de lei do governo socialista para permitir o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, mas descartou a possibilidade de que estes casais possam adotar crianças.
Após a votação, que contou com o apoio de toda a esquerda parlamentar, o primeiro-ministro português, José Sócrates, qualificou este dia como "um momento histórico" para Portugal no "combate contra a discriminação e a injustiça que existia na sociedade portuguesa".
"Fizemos o que qualquer humanista deve fazer, combater as injustiças dos outros como se fossem injustiças contra nós, combater as normas legais que impedem a igualdade como se afetasse a nós mesmos", disse Sócrates.
A proposta do governo foi aprovada com os votos favoráveis do Partido Socialista (PS), que governa em minoria com 97 das 230 cadeiras da Assembleia; o Partido Comunista de Portugal (PCP), com 13 assentos; o Bloco de Esquerda, com 16, e os Verdes, com dois.
As duas deputadas do Movimento Humanismo e Democracia, independentes, mas escolhidas nas listas do PS, foram as únicas representantes da esquerda parlamentar que votaram contra.
Os deputados da principal força da oposição, o Partido Social Democrata (PSD), foram contra a proposição, exceto sete que se abstiveram, e também houve a rejeição dos parlamentares do conservador Centro Democrático Social-Partido Popular (CDS-PP).
O Parlamento não aprovou as proposições realizadas pelo Bloco de Esquerda e os Verdes, nas quais pediam a legalização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e nas quais estava incluída a adoção.
A Assembleia da República também votou contra o projeto do PSD para a criação de uma união civil registrada que conferia, com alguns limites patrimoniais e parentais, os mesmos direitos que o casamento homossexual.
As propostas do Bloco de Esquerda e dos Verdes tiveram os votos contrários o CDS-PP, do PSD e da maioria dos socialistas.
Para que a lei entre em vigor, é necessário que esta seja promulgada nos próximos 40 dias pelo presidente português, o conservador Aníbal Cavaco Silva, com direito a veto. O veto pode ser derrubado pelo Parlamento. Se não houver veto, os primeiros casamentos podem ser celebrados já em abril.
Cavaco Silva, líder histórico do opositor Partido Social Democrata, não quis se pronunciar sobre a lei de casamento homossexual, mas destacou diversas vezes que sua atenção está em "outros problemas do país", e que não fará nada "que provoque fraturas" na sociedade.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Los Hermanos outra vez!!!! (texto)

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, assinou um decreto no qual ordena a abertura dos arquivos relacionados à atuação das Forças Armadas durante a ditadura militar que governou o país de 1973 a 1983.
Por meio do decreto, o governo retirou a classificação "de segurança" das informações que dizem respeito ao período. Assim, o decreto determina a abertura de "toda aquela informação e documentação vinculada à atuação das Forças Armadas" de 1976 e 1983, salvo aquela relacionada ao "conflito bélico do Atlântico Sul [Guerra das Malvinas] e a qualquer outro conflito de caráter interestatal".
A iniciativa também se vincula à retomada de processos por violações dos direitos humanos cometidas durante a ditadura, o que se tornou possível após a anulação das chamadas leis de impunidade - Obediência Devida e Ponto Final -, durante a Presidência de Néstor Kirchner (2003-2007).
O secretário de Direitos Humanos da Argentina, Eduardo Luis Duhalde, disse que "a medida agiliza a remissão das informações ao Poder Judiciário". A ditadura argentina foi uma das mais violentas da região. Em apenas sete anos de regime, estima-se que cerca de 30 mil pessoas tenham desaparecido nas mãos de agentes da repressão, segundo entidades defensoras dos direitos humanos. Nos últimos anos, comandantes das Forças Armadas, autoridades e agentes da repressão foram ao banco dos réus.

Solidão na velhice...

A solidão na velhice é uma experiência profundamente marcada pela complexidade da existência humana. Com o passar dos anos, os vínculos soci...