quinta-feira, 19 de junho de 2025

Pensamento acordado dentro de nós



Há dias em que a cabeça não silencia. O corpo pede sono, mas a mente insiste em continuar — ideias, projetos, pensamentos atravessam a noite como se a madrugada fosse uma extensão. Não se trata de criatividade pulsante, mas de uma espécie de assombro: um pensamento que volta, que não cessa, que ocupa todos os lugares. Tenta-se dormir, mas é como se o pensamento estivesse acordado dentro de nós. O nome disso pode ser obsessão, ansiedade, excesso — ou talvez apenas o modo como o desejo encontra uma forma de dizer que algo não está sendo dito.

É uma ilusão pensar que podemos simplesmente "nos livrar" desses pensamentos. Porque o que retorna com insistência quer ser escutado. A cabeça que não para é, muitas vezes, o sintoma de um silêncio mais profundo: o silêncio de algo que não está sendo vivido, de um luto não feito, de um desejo contido ou de uma dor não nomeada. E o pensamento — esse que julgamos racional — pode ser apenas uma máscara para o afeto que não pôde emergir. Tentamos controlar, planejar, ocupar, mas é o inconsciente que está ali, pedindo passagem.

Às vezes, escrever ajuda. Dar forma ao que nos atravessa é uma maneira de não nos perdermos no turbilhão. Escrever não para encontrar resposta, mas para criar uma borda, um contorno para aquilo que nos habita sem forma. É também uma pausa — não do pensamento, mas da sua repetição muda. Escrever é um modo de conversar com esse excesso, de fazê-lo virar linguagem, e talvez, quem sabe, encontrar um pouco de sossego entre uma linha e outra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Uma chatice que pesa mais do que qualquer sandália

Os tempos atuais no Brasil são atravessados por uma polarização que parece transformar qualquer gesto banal em campo de batalha simbólico . ...