sábado, 16 de agosto de 2025

Quanto mais cansado o público, mais fácil naturalizar o absurdo


A extrema direita aprendeu a transformar o espaço da notícia em palco permanente. É como se cada manchete fosse uma cortina que se abre diariamente para a repetição de um espetáculo ruidoso. O método é simples: falar, provocar, escandalizar, repetir. Assim, o noticiário se torna um carrossel de polêmicas que giram sem parar, deixando o público entre o espanto e o cansaço. Não se trata de informar, mas de ocupar — de marcar presença, de garantir que os olhos e ouvidos estejam sempre voltados para o mesmo ponto.

Essa ocupação constante produz um efeito corrosivo. O leitor, o telespectador, o ouvinte são bombardeados sem descanso, como se não houvesse mais silêncio possível no espaço público. O ruído se converte em fundo de tela, e a cada novo dia a exaustão se acumula. O desgaste não vem apenas do excesso de informação, mas da repetição de um mesmo enredo: um inimigo inventado, uma afronta teatral, uma frase dita para ferir. O ciclo se fecha e logo recomeça, como se fosse impossível escapar.

A própria mídia, na ânsia de noticiar tudo, acaba reproduzindo o método que a desgasta. Ao transformar cada provocação em manchete, reforça o espetáculo diário e ajuda a manter a extrema direita no centro da cena. O jornalismo, nesse processo, parece esquecer que a visibilidade também é uma forma de poder, e que dar palco constante ao escândalo significa legitimar a encenação. Assim, o que deveria ser crítica e investigação se converte em vitrine: o noticiário torna-se cúmplice involuntário do cansaço político que denuncia.

O resultado é que a política se converte em um espetáculo cansativo, em que o barulho substitui o debate. Em vez de argumentos, slogans. Em vez de reflexão, ataques. A exaustão se torna um recurso político:
quanto mais cansado o público, mais fácil naturalizar o absurdo
. Resistir a esse método significa olhar para além da cortina de fumaça e buscar nos intervalos — nos temas apagados e nas vozes silenciadas — a possibilidade de outro debate. Reconhecer o cansaço é o primeiro passo; romper o ciclo e recuperar a densidade da palavra pública é o desafio urgente.

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