terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Narrativas apocalípticas e a apropriação de textos bíblicos fora de seus contextos históricos para justificar posições extremistas



Os cristãos de extrema-direita representam um segmento específico dentro das comunidades religiosas que, embora compartilhe princípios de fé cristã, articula sua prática e discurso a partir de uma forte aliança com valores conservadores e um projeto político marcado por autoritarismo. Essa vertente, ao reivindicar a defesa de uma suposta moral cristã, frequentemente instrumentaliza a religião como base de legitimação para pautas como a rejeição de direitos LGBTQIA+, a oposição ao feminismo e a limitação de políticas progressistas. Ao fazer isso, não apenas desconsideram a diversidade interna das comunidades cristãs, mas também tornam invisíveis outras leituras do cristianismo que se orientam pela inclusão, acolhimento e justiça social.

A atuação política dos cristãos de extrema-direita tem se ampliado em muitos contextos ao adotar um discurso polarizador, que constrói "inimigos" da fé, sejam eles políticos, sociais ou culturais. É comum que esses grupos se posicionem contra o secularismo e defendam uma fusão entre Estado e religião, buscando impor suas visões como normas para toda a sociedade. Em muitos casos, o discurso deles apoia líderes carismáticos que se apresentam como defensores da "moral e dos bons costumes", mas que, paradoxalmente, promovem políticas de exclusão e discursos de ódio, em nome de uma suposta guerra cultural contra o que chamam de "ameaças à família tradicional".

Uma característica central desse grupo é o uso de narrativas apocalípticas e a apropriação de textos bíblicos fora de seus contextos históricos para justificar posições extremistas. Essas leituras, ao serem simplificadas e usadas como ferramentas políticas, distanciam-se da complexidade da teologia cristã e ignoram o caráter simbólico de muitos textos sagrados. Essa abordagem promove uma fé baseada no medo e na intolerância, em oposição a princípios fundamentais do cristianismo, como o amor ao próximo, o perdão e a empatia.

É importante lembrar que a associação entre o cristianismo e a extrema-direita não representa o todo das comunidades cristãs, muitas das quais trabalham ativamente em prol da justiça social, da igualdade e do diálogo inter-religioso. A crítica aos cristãos de extrema-direita, portanto, não é uma rejeição à fé cristã em si, mas sim à manipulação dessa fé para fins ideológicos que contradizem os próprios valores que ela afirma defender. Em um mundo cada vez mais polarizado, é essencial distinguir entre as diversas vozes cristãs e reconhecer que o cristianismo, como toda tradição religiosa, é plural e multifacetado.

sábado, 25 de janeiro de 2025

O ódio e a intolerância se consolidam como linguagem política


O Brasil, assim como outras partes do mundo, tem se tornado palco de um crescente clima de ódio, agressões e disputas que parecem impregnar as relações sociais e políticas. Essas tensões têm um forte componente ideológico, com a polarização entre a esquerda e a extrema direita servindo como combustível para uma sociedade cada vez mais dividida. O debate político ultrapassa os limites da esfera institucional e invade o cotidiano das pessoas, transformando até mesmo temas humanitários em arenas de embates ferozes. O resultado é um cenário em que nada parece fazer sentido, onde valores são constantemente contraditos por aqueles que os defendem.

Exemplos dessa contradição aparecem na postura de grupos cristãos que, em nome de Deus, praticam a exclusão, defendem a violência e agridem outras religiões, especialmente as de matriz africana. Essa visão deturpada da fé cristã é agravada por discursos que justificam a intolerância como forma de proteção de valores supostamente ameaçados. Nos Estados Unidos, o governo de Donald Trump está marcado por medidas controversas que exacerbaram divisões sociais. Entre elas, destaca-se a decisão de obrigar apenados transgêneros a cumprir suas penas de acordo com o sexo atribuído ao nascimento, uma medida que ignora direitos humanos básicos e reforça a marginalização desse grupo.

Outra política de destaque foi a deportação em massa de imigrantes ilegais, baseada em uma narrativa que associa imigração à criminalidade. Essa associação fortaleceu o preconceito contra comunidades imigrantes, alimentando um ciclo de estigmatização e exclusão social. Nos Estados Unidos, o imigrante passou a ser, cada vez mais, percebido como uma ameaça, o que contribuiu para a disseminação de discursos xenófobos e a criação de barreiras para a integração dessas pessoas. Tais medidas não apenas prejudicam indivíduos e famílias, mas também enfraquecem os laços sociais necessários para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

No Brasil, o quadro não é menos alarmante. A divisão entre os partidários do PL e do PT tem reduzido o debate público a um embate dicotômico, como se todas as questões sociais e políticas girassem em torno dessas duas forças. Essa polarização extrema tem impedido a construção de pontes e diálogos, alimentando um ambiente de hostilidade e desconfiança mútua. Enquanto o ódio e a intolerância se consolidam como linguagem política, o espaço para reflexões mais profundas sobre os problemas do país se torna cada vez mais escasso, deixando um vácuo onde deveriam existir propostas para um futuro mais solidário e democrático.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

TRUMP: gestos nazistas, postura excludente, supremacistas, discurso de ódio contra as minorias etc etc etc.


A posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, em 20 de janeiro de 2017, foi marcada por declarações controversas que mostram uma postura polarizadora e beligerante. Durante seu discurso, Trump apresentou uma visão de um país supostamente em ruínas, empregando termos como "carnificina americana" para descrever a situação econômica e social dos Estados Unidos. Essa narrativa, carregada de alarmismo, ignorava dados que mostravam avanços em diversas áreas nos anos anteriores, reforçando uma perspectiva de crise para justificar suas políticas futuras.

Entre as medidas mais impactantes do governo Trump nos primeiros dias estava a assinatura de ordens executivas voltadas contra imigrantes. A medida, sob a justificativa de segurança nacional, atingiu milhares de famílias e já está sendo alvo de denúncias judiciais, que aumentam as tensões entre a administração Trump e grupos de defesa dos direitos civis.

Além das restrições à imigração, o discurso e as ações de Trump frequentemente deslegitimam a diversidade cultural e racial dos Estados Unidos. Sua retórica é marcada por ataques a comunidades latinas, especialmente imigrantes mexicanos, retratados como criminosos e traficantes. Essa visão burra, simplista e xenófoba, amplificada por promessas como a construção de um muro na fronteira com o México, alimenta divisões internas e enfraquece o caráter multicultural que historicamente constitui a identidade americana.

Por fim, as políticas e discursos de Trump na presidência revelam um projeto político que mina valores fundamentais de inclusão e respeito à diversidade. Suas ações polarizam ainda mais uma sociedade já marcada por desigualdades, promovendo um nacionalismo excludente que desconsidera o papel crucial dos imigrantes e das minorias na construção dos Estados Unidos. O legado de sua posse e do início de seu mandato ecoa como um alerta sobre os perigos de narrativas que promovem a exclusão e o medo como instrumentos de poder.

A sua retórica foi direcionada a um público específico: a base conservadora americana, predominantemente formada por eleitores brancos das áreas rurais e trabalhadores desiludidos com o sistema político tradicional. Trump explorou o ressentimento de uma parcela da população que se sente ignorada pelas elites políticas e culturais, construindo uma narrativa de "nós contra eles". Ele prometeu restaurar um suposto passado glorioso, apelando para sentimentos nacionalistas e para a insatisfação econômica e social desses grupos, especialmente aqueles afetados pela desindustrialização.

Os apoiadores de Trump, por sua vez, não apenas aderem a essa visão como frequentemente a ampliam, seja em discursos públicos, seja em redes sociais. Grupos ultraconservadores e nacionalistas brancos, como os supremacistas e movimentos como os "Proud Boys", encontraram no discurso de Trump uma validação de suas ideologias. O respaldo presidencial a teorias conspiratórias e o incentivo indireto a discursos de ódio reforçam um ambiente em que preconceitos se normalizaram. Essa aliança entre Trump e seus seguidores consolida uma base fiel que não apenas corrobora suas ideias, mas também as defende com fervor, legitimando políticas discriminatórias e xenófobas como parte de um suposto esforço para proteger a "identidade americana".

E como se tudo isso já não fosse suficiente, durante a cerimônia de posse, gestos simbólicos também chamaram a atenção e alimentaram controvérsias. Um exemplo disso foi a presença de figuras públicas, como Elon Musk, que realizou gestos associados a simbologias nazistas, gerando ampla condenação nas redes sociais e por parte de especialistas em movimentos extremistas. Esse episódio, somado às primeiras ações de Trump reforçou a percepção de que sua administração não apenas tolerava, mas por vezes legitimava discursos e práticas alinhadas ao autoritarismo e à intolerância. Essa postura fica ainda mais evidente com os perdões concedidos a figuras controversas, como traficantes de drogas e indivíduos envolvidos na invasão do Capitólio, mostrando uma estratégia de fortalecer alianças políticas à custa de valores democráticos e do respeito ao Estado de Direito.

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

16 anos: Um lugar para ser e dizer



Há 16 anos, o Blog Do Avesso nasceu despretensiosamente, como um espaço para compartilhar as impressões de uma viagem inesquecível a Buenos Aires. O que começou como um relato de momentos vividos, compartilhamento de fotos na capital portenha se transformou em um refúgio de palavras, um espaço onde cada texto reflete o meu olhar sobre o mundo, sobre mim e sobre os entrelaces da vida. Aqui, entre linhas e entrelinhas, deixo transbordar o que gosto e o que não gosto, o que me inquieta e o que me conforta.

Ao longo desses anos, o blog não seguiu um padrão nem se prendeu a rótulos. Não é científico, jornalístico ou informativo. É pessoal, íntimo, pulsante. É minha voz escrita, ecoando pensamentos, sentimentos e vivências. Tem momentos de maior intensidade, em que escrevo mais, como se o teclado pudesse dar conta de tudo o que transborda de mim. Em outros períodos, as palavras chegam mais devagar, como quem espera o momento certo para se manifestar.

Neste último ano, as postagens têm sido mais frequentes, refletindo sobre a minha vida, minhas experiências e os encontros – e desencontros – que me moldam. Escrever aqui tem sido um diálogo constante comigo mesmo, um espelho de emoções e inquietações. O Blog Do Avesso não é apenas um lugar para escrever; é um lugar para ser, para me reconhecer e, às vezes, até para me perder entre as tantas possibilidades de dizer.

Celebrar os 16 anos deste espaço é, acima de tudo, celebrar a liberdade de escrever sem amarras, de falar do que importa para mim e de encontrar, na escrita, uma forma de existir. Que venham mais anos, mais textos e mais momentos de entrega, porque, no fundo, este blog não é apenas meu – ele é também um convite para que cada leitor encontre, aqui, um pouco de si.

domingo, 19 de janeiro de 2025

Soixante

Hoje, completo sessenta anos de existência. Uma trajetória que se desenrolou em meio às mudanças do tempo, aos aprendizados constantes e às marcas que a vida me permitiu deixar e receber. Cada ano vivido é uma peça única no conjunto que forma quem sou, com suas luzes e sombras, encontros e despedidas, conquistas e recomeços. É impossível olhar para trás sem reconhecer a importância de cada instante, até mesmo daqueles que, no momento, pareciam apenas desafiadores.

Seis décadas significam mais do que tempo. Representam histórias partilhadas, momentos de superação e o simples fato de estar aqui. É uma alegria imensa saber que, apesar das adversidades, a vida continua a me abraçar, oferecendo a chance de renovar sentidos e de caminhar com a alma aberta ao que está por vir. Celebrar não é sobre grandes alardes, mas sobre reconhecer, em silêncio, a profundidade e o privilégio de estar vivo.

Hoje, escolho celebrar a vida com gratidão, por tudo o que me trouxe até aqui. Pelos afetos, pelas trocas e pela possibilidade de continuar aprendendo e me transformando. Este dia é um marco, mas também é um convite para seguir adiante com a coragem de quem sabe que viver é, acima de tudo, um ato de esperança.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

BBB: A tv (Globo, mas não apenas ela) aberta força uma relevância e molda as conversas públicas



A imposição do Big Brother Brasil (BBB) na programação da TV aberta, especialmente na Rede Globo (mas não apenas, porque outras emissoras tb se alimentam desse programa), levanta questões sobre a falta de alternativas para quem não tem acesso à TV por assinatura ou plataformas de streaming. Com uma antena interna, a Globo muitas vezes é a única opção de entretenimento para milhões de brasileiros, consolidando o BBB como o centro das discussões televisivas e sociais durante sua exibição. Isso cria um cenário em que aqueles que não apreciam o programa se veem sem alternativas atraentes, tornando-se reféns de uma grade de programação limitada e massificada.

Essa hegemonia do BBB não se limita à exibição do programa em si, mas se estende ao jornalismo e às outras atrações da emissora, que frequentemente incorporam pautas e debates relacionados ao reality show. Sem falar (e já falando) das inserções durante a programação. A narrativa dominante transforma o programa em um fenômeno inevitável, forçando sua relevância e moldando as conversas públicas. Para quem não se interessa pelo formato ou pelo conteúdo apresentado, essa insistência pode ser percebida como um excesso, uma vez que se restringe o acesso a outras formas de entretenimento ou informação na televisão aberta.

A questão central, portanto, é como equilibrar o poder de atração de um programa de sucesso com a responsabilidade de oferecer uma programação mais diversa e inclusiva para os telespectadores. Enquanto o BBB conquista grande audiência e engajamento, a ausência de opções alternativas reforça a sensação de que o espectador sem acesso a outros meios está preso a um modelo de consumo único e monopolizador. Esse cenário reflete não apenas uma limitação na pluralidade da oferta televisiva, mas também um desafio maior para a democratização da mídia e do entretenimento no Brasil.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Últimos dias de férias



As férias sempre trazem aquela sensação de liberdade, de respirar fundo e sair da rotina, mas também carregam a sombra do retorno. Com o dia 18 de janeiro se aproximando, sinto que não estou pronto para voltar para Cascavel, Paraná. Não que tudo seja perfeito onde estou, mas em Cascavel sei exatamente o que não vou encontrar. A ideia de retornar à rotina, enfrentar o trabalho acumulado e revisitar as demandas diárias é um peso que diminui o brilho desses últimos dias de descanso.

Aqui, no Rio, a relação é de carinho e afeto. É o lugar onde construí memórias importantes e onde meus amigos estão, oferecendo uma rede de apoio que faz a vida parecer mais leve. Mais do que isso, é a distância das obrigações que torna esses momentos ainda mais preciosos. A tranquilidade de não estar enrolado com trabalho, de não ter prazos pressionando ou decisões para tomar, cria um estado que desejo prolongar. O Rio, com toda a sua imperfeição, representa esse intervalo, essa pausa tão necessária.

Se pudesse, prolongaria essas férias por mais alguns dias, apenas para saborear um pouco mais essa liberdade. É o desejo de adiar o inevitável, de me permitir viver sem o peso das responsabilidades, nem que seja por um curto tempo. Mas sei que o retorno se aproxima e, com ele, a oportunidade de encarar a rotina com um olhar renovado, mesmo que ainda não me sinta totalmente preparado para isso. Afinal, talvez parte de estar de férias seja também aprender a valorizar o descanso enquanto ele acontece e carregá-lo como um alívio na bagagem ao voltar para a realidade.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

Precisa mesmo fazer parte do nosso dia a dia?



O Big Brother, além de ser um programa de entretenimento raso que promove conflitos, conversas superficiais e uma competição artificial, se tornou também uma imposição cultural por parte da Rede Globo. A emissora, com sua abrangência nacional, praticamente obriga o público a estar ciente do que acontece no programa, mesmo aqueles que não têm interesse. Durante os intervalos de novelas, programas jornalísticos e outros conteúdos, a Globo insere chamadas constantes sobre o reality, colocando-o no centro de sua programação e dificultando que os espectadores escapem dessa narrativa.

Esse excesso de exposição do Big Brother reforça a sensação de que ele é onipresente na vida cotidiana, direcionando o foco para um conteúdo que pouco contribui para a formação crítica ou cultural do público. A estratégia da emissora, voltada para maximizar audiência e engajamento nas redes sociais, cria um ciclo no qual o reality show domina as conversas e os espaços midiáticos, sufocando outros conteúdos que poderiam ser mais relevantes ou enriquecedores. Para aqueles que buscam informação ou entretenimento de qualidade, a constante presença do programa nos intervalos e até nos noticiários é um incômodo que desvaloriza o restante da programação.

Essa insistência em promover o Big Brother reflete um desrespeito ao público que não deseja consumir esse tipo de conteúdo. A Globo, ao integrar o reality em diversos horários e formatos, contribui para a superficialização do debate cultural e limita as opções de quem busca diversidade na TV aberta. Em vez de estimular reflexões ou oferecer alternativas que promovam o pensamento crítico, a emissora se prende a um formato que prioriza brigas, fofocas e superficialidades, reforçando um padrão que, na prática, pouco acrescenta ao desenvolvimento cultural ou intelectual da sociedade.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

O que você está enfrentando de Sigrid Nunez



O que você está enfrentando, da autora Sigrid Nunez, é um romance que explora as complexidades da condição humana por meio de uma narrativa introspectiva e sensível. A história é conduzida por uma narradora que, ao acompanhar uma amiga com câncer terminal, se vê imersa em reflexões profundas sobre a vida, a morte e as relações interpessoais. Através de encontros com diversas pessoas, ela coleta relatos de experiências dolorosas, como a perda progressiva da sanidade de uma mãe idosa e as angústias do envelhecimento, tecendo uma tapeçaria de vivências que revelam a universalidade dos desafios humanos.

Nunez utiliza uma prosa elegante e poética para abordar temas muitas vezes espinhosos, sem recorrer a clichês ou sentimentalismos excessivos. A relação entre a narradora e sua amiga doente é retratada com uma cumplicidade rara, onde o processo de morrer é enfrentado de maneira racional e, por vezes, cômica. Essa abordagem permite uma reflexão sincera sobre a mortalidade e a forma como as pessoas lidam com o fim da vida, oferecendo ao leitor uma perspectiva que é ao mesmo tempo íntima e universal.

Ao proporcionar a experiência de se colocar no lugar do outro, O que você está enfrentando convida o leitor a uma empatia profunda, revelando sentimentos comuns a todos e oferecendo um conforto duradouro para os desafios que a vida apresenta. A obra destaca a importância da escuta e do acolhimento, mostrando que, ao compartilhar nossas histórias e ouvir as dos outros, encontramos um sentido de conexão e compreensão que nos ajuda a enfrentar as adversidades com mais serenidade e coragem.

O desafio está em nos permitirmos acreditar no afeto



Muitas vezes, nossa mente se torna um palco para histórias que criamos (porque ouvimos e entendemos de um lugar específico), histórias que geralmente nos afetam profundamente. É claro que nem sempre nos damos conta disso. É comum imaginarmos coisas sobre o que os outros pensam de nós, muitas vezes de forma negativa. Essas narrativas podem surgir da nossa insegurança, do medo de rejeição ou mesmo de experiências passadas que marcaram nossas percepções. No entanto, é importante lembrar que o que criamos em nossa cabeça raramente corresponde ao que as pessoas sentem ou pensam (não acessamos a cabeça do outro).

Um exemplo disso é a sensação de “estar sobrando”, como se nossa presença fosse apenas tolerada por educação, e não verdadeiramente desejada. Esse tipo de pensamento pode ser uma manifestação de algum abandono que vivenciamos (real ou imaginariamente) e está lá no inconsciente produzindo alguma baixa autoestima ou autocrítica excessiva, que nos faz duvidar do nosso valor nas relações. A verdade é que as pessoas, em sua maioria, não investem tempo ou energia em alguém por pura obrigação. Há afeto, consideração e, muitas vezes, admiração que não enxergamos porque estamos ocupados demais acreditando no contrário.

Essas histórias que criamos em nossa mente podem se tornar armadilhas emocionais, nos isolando e nos impedindo de viver plenamente as experiências e os vínculos que poderiam ser enriquecedores. É como se estivéssemos sempre olhando para o reflexo de nossos próprios medos, em vez de encarar o mundo com curiosidade e abertura. Questionar esses pensamentos é essencial: por que eu assumo que não sou desejado? Que sinais concretos tenho disso? Muitas vezes, ao investigar essas perguntas, percebemos que não há fundamento para essas crenças.

O desafio está em nos permitirmos acreditar no afeto e na aceitação dos outros, sem projetar neles nossas inseguranças. As pessoas convidam porque querem compartilhar momentos, porque reconhecem algo de especial em nossa presença, mesmo que não expressem isso o tempo todo. Ao nos libertarmos dessas construções mentais negativas, abrimos espaço para nos relacionarmos de maneira mais leve, confiando que, sim, pertencemos aos lugares onde estamos e que somos mais importantes para os outros do que nossa mente, às vezes, nos faz acreditar.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

8 de janeiro


O dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, ficará marcado na história do Brasil como um dos momentos mais críticos de nossa jovem democracia. Nesse domingo, milhares de manifestantes bolsonaristas protagonizaram atos violentos ao invadir e depredar as sedes dos Três Poderes — o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional (Câmara e Senado) e o Supremo Tribunal Federal. Movidos por narrativas golpistas e falsas alegações de fraude eleitoral, eles buscaram desestabilizar o sistema democrático, desafiando o Estado de Direito em sua essência. As cenas de destruição chocaram o país e o mundo, evidenciando o perigo das campanhas de desinformação e do radicalismo político.

No decorrer das investigações, 1.682 pessoas foram denunciadas, indicando ampla mobilização de grupos alinhados a ideais autoritários. Desses, quase 900 tiveram denúncias aceitas pela Justiça, com 527 réus condenados até o momento. As penas variaram de medidas mais leves, como restrição de direitos, a condenações severas, com 317 sentenças de prisão que chegam a 17 anos de reclusão. Essas decisões judiciais refletem o esforço do sistema de Justiça brasileiro para punir os envolvidos e reafirmar que atos contrários à democracia terão consequências. No entanto, o processo também expõe os desafios institucionais em lidar com um evento de tamanha gravidade e com implicações tão amplas.

Os atos do 8 de janeiro não foram simples manifestações: representaram uma tentativa explícita de golpe de Estado. Os manifestantes buscavam reverter o resultado das eleições presidenciais de 2022, que consagraram Luiz Inácio Lula da Silva como presidente, desafiando a soberania popular expressa nas urnas. Mais do que um ataque físico às instituições, o ocorrido foi um ataque à democracia brasileira. O episódio exige uma reflexão profunda sobre as raízes do extremismo político, o papel das lideranças que incentivaram esses atos e a importância de fortalecer os mecanismos democráticos e educativos para evitar que eventos semelhantes voltem a ocorrer.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Sobre a vitória de Fernanda Torres - melhor atriz de drama - no Globo de Ouro



A conquista do Globo de Ouro pela atriz Fernanda Torres foi um marco não apenas para sua carreira, mas para a representação do talento latino-americano no cenário internacional. Ao se tornar a primeira brasileira e sul-americana a ser indicada e a ganhar o prêmio, Fernanda quebrou barreiras culturais e linguísticas. Sua vitória destaca a relevância da produção cultural fora do eixo anglófono, em um evento tradicionalmente dominado por obras e artistas de língua inglesa. É um reconhecimento histórico que eleva o cinema e o talento brasileiro a um patamar mais visível no panorama global.

Fernanda Torres é uma artista multifacetada, com uma trajetória que transita entre o drama e a comédia, sempre trazendo profundidade e autenticidade aos seus papéis. Sua atuação é marcada por uma inteligência sensível que capta as nuances da condição humana, seja ao interpretar personagens complexos em dramas intensos, seja ao explorar o humor com maestria. Além de sua atuação como atriz, Fernanda é uma escritora talentosa e pensadora que reflete sobre questões da sociedade contemporânea em suas crônicas e ensaios, reafirmando-se como uma intelectual completa. Essa versatilidade é rara e fundamental para a compreensão de seu impacto no cenário cultural.

O fato de Fernanda Torres ter sido uma das poucas atrizes não falantes de inglês a ser indicada ao Globo de Ouro realça a dimensão de sua conquista. Até hoje, apenas uma pequena parcela de artistas de fora do circuito anglófono conseguiu romper essa barreira, demonstrando a dificuldade de reconhecimento internacional para produções e artistas que desafiam o hegemonismo cultural. Sua vitória não apenas celebra sua própria excelência, mas também levanta uma reflexão sobre a importância de diversificar as narrativas reconhecidas e premiadas por instituições culturais globais. É um lembrete de que o talento transcende fronteiras e idiomas.

A vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro é mais do que um prêmio individual; é uma conquista coletiva que simboliza a força e a riqueza da cultura brasileira e sul-americana. Sua trajetória inspira novas gerações de artistas a sonharem alto, mesmo em um cenário desafiador e muitas vezes excludente. É também um convite para que o mundo olhe com mais atenção e respeito para a diversidade artística de nossa região, reconhecendo que a universalidade das emoções e narrativas não depende da língua em que são expressas, mas da verdade com que são contadas. Fernanda, com seu talento e dedicação, tornou-se um símbolo desse potencial universal.

domingo, 5 de janeiro de 2025

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Um vazio desconcertante



Há pessoas cuja única moeda de troca na vida parece ser a beleza (ou alguma beleza). Elas entram em qualquer ambiente e chamam atenção pelo físico, pela estética cuidadosamente trabalhada ou pela genética generosa. Mas, ao raspar a superfície, o que resta é um vazio desconcertante. Não há conversas que inspirem, reflexões que instiguem ou mesmo curiosidade sobre o mundo. Essas pessoas se apresentam como um quadro bonito em uma moldura cara, mas o conteúdo é tão raso que, no final, fica difícil sustentar qualquer tipo de conexão além do superficial.

A ausência de conteúdo não é apenas uma escolha, mas muitas vezes o resultado de uma vida que priorizou a aparência em detrimento do conhecimento, da empatia e do desenvolvimento pessoal. Não leem, não assistem a nada que as desafie, não se interessam por explorar ideias ou questionar as próprias certezas. Para elas, o tempo é consumido pelo espelho, pelas redes sociais ou pelo constante exercício de reafirmar a própria atratividade. A vida se reduz a um palco onde a performance física é o único espetáculo, e qualquer tentativa de aprofundamento é vista como desnecessária ou cansativa.

Quando o desempenho sexual na cama se torna o principal atributo, fica evidente como essas pessoas restringem suas relações à dimensão mais básica da experiência humana. O sexo, que pode ser uma expressão profunda de conexão, intimidade e troca, é transformado em um ato vazio, reduzido ao desempenho e à validação. Sem diálogo, sem troca de ideias e sem interesses comuns, o que resta é uma interação mecânica, incapaz de nutrir algo além do físico. Para quem busca relações mais ricas e completas, essa superficialidade se torna rapidamente frustrante.

No fundo, a beleza, por mais impressionante que seja, é transitória. Sem um conteúdo que a sustente, sem interesses, histórias ou valores, o brilho da aparência começa a se apagar com o tempo. E o que fica? Uma sensação de vazio, de oportunidades perdidas para crescer e construir algo significativo. Pessoas assim podem atrair no início, mas a verdadeira conexão exige muito mais do que um rosto bonito ou um corpo atraente. Exige presença, vontade de aprender, de crescer e de oferecer ao outro algo além do que é efêmero e visível.

Geração Beta



A Geração Beta, composta por aqueles nascidos a partir de 2025, será marcada pela imersão em um mundo moldado por avanços tecnológicos e desafios globais. Eles crescerão em um ambiente onde a tecnologia é onipresente, com ferramentas como inteligência artificial, realidade aumentada e internet das coisas integradas ao cotidiano. A educação dessa geração será altamente personalizada, baseada em dados e voltada para a resolução de problemas e o desenvolvimento de criatividade. Além disso, valores como sustentabilidade, inclusão e diversidade estarão no centro de suas prioridades, refletindo a pressão global para práticas mais conscientes e justas.

Esses avanços tecnológicos e médicos podem possibilitar que muitos integrantes dessa geração vivam até o século XXII. Com progressos na biotecnologia, terapias genéticas e inteligência artificial aplicada à saúde, a expectativa de vida está se expandindo significativamente. Isso transformará a forma como os Betas planejam suas vidas, carreiras e famílias, reorganizando os conceitos de juventude, maturidade e envelhecimento. No entanto, o desafio de navegar por um mundo em constante transformação exigirá resiliência diante de crises climáticas, desigualdades globais e dilemas éticos sobre o uso da tecnologia.

Os Betas serão herdeiros de problemas complexos, mas também pioneiros na busca por soluções inovadoras que redefinam os limites da humanidade. Com uma vida mais longa e um mundo em constante conexão digital, precisarão equilibrar o uso da tecnologia com a saúde mental e o bem-estar emocional. Ao mesmo tempo, sua capacidade de transformar a crise em oportunidade será crucial para moldar um futuro mais sustentável, inclusivo e dinâmico. Eles não serão apenas testemunhas do século XXII, mas protagonistas de uma era que promete reconfigurar as bases da vida humana.

A cara do bolsonarista: Um tipo em construção

O bolsonarista, enquanto figura construída discursivamente, carrega uma marca que se apresenta como um tipo social. Ele é frequentemente descrito como um homem de meia idade, branco, com o rosto marcado pelo tempo. Mas essas características não são apenas biológicas: elas se tornam símbolos de uma posição ideológica. Seu semblante carrega a agressividade de um discurso que clama por ordem, autoridade e controle (seja lá o que isso signifique em sua cabeça). Ele é o retrato de uma parcela da sociedade que sente que perdeu privilégios ou que está em luta constante para mantê-los.

Esse rosto, entretanto,  é uma expressão coletiva, uma máscara moldada por um discurso golpista, armamentista e autoritário. Ele é atravessado por narrativas que glorificam a violência como solução e demonizam a diferença como ameaça. O bolsonarista é o sujeito que se interpela pela promessa de um retorno a uma suposta “grandeza nacional”, onde hierarquias rígidas e valores conservadores (até a meia noite) seriam restaurados. Sua agressividade não é apenas um traço, mas uma performance ideológica: ele atua como defensor de um mundo que julga estar desmoronando.

Mas é importante lembrar que, como toda construção discursiva, essa figura não é imutável. Ela é sustentada por um contexto histórico, por condições sociais e por uma constante retroalimentação de discursos ideológicos. O “bolsonarista” como tipo social é uma metáfora poderosa, mas também perigosa, pois reduz a complexidade do sujeito a uma formação imaginária. Compreendê-lo em sua multiplicidade é um desafio necessário para desarmar as armadilhas do discurso que sustenta essa identidade.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Pêcheux vs. Foucault



As diferenças entre Michel Pêcheux e Michel Foucault sobre o discurso, conforme analisado no texto*, centram-se principalmente em seus pressupostos epistemológicos e no papel que atribuem à linguagem e à história:

  1. Relação com a Linguística: Pêcheux baseia sua análise do discurso em um diálogo direto com a linguística, utilizando conceitos como enunciado e formação discursiva, e reconhecendo a língua como uma base necessária para o discurso. Já Foucault se distancia da linguística tradicional, concentrando-se em como os discursos estruturam os campos de saber e poder, sem depender diretamente de categorias linguísticas específicas​.

  2. Historicidade do Discurso: Ambos concordam que o discurso é histórico, mas divergem na forma de abordar essa historicidade. Pêcheux considera que o discurso é atravessado pela ideologia e que as formações discursivas são ancoradas em condições materiais específicas. Foucault, por sua vez, vê o discurso como um espaço onde se desenrolam práticas discursivas que constituem e organizam saberes, com ênfase na normatividade e na dispersão dos enunciados​.

  3. Conceito de Enunciação: Pêcheux trabalha o conceito de enunciação como uma operação que articula língua, ideologia e história, destacando a relação entre estrutura e processo. Foucault, por outro lado, vê a enunciação como uma prática que não se restringe às fronteiras da língua, mas que é fundamentalmente histórica e heterogênea, problematizando o sujeito e suas condições de possibilidade no campo discursivo​.

Assim, enquanto Pêcheux enfatiza a materialidade da língua e sua relação com as formações discursivas ideológicas, Foucault se concentra na materialidade do discurso como prática histórica e normativa, explorando a constituição dos sujeitos e dos campos de saber. Essas diferenças refletem abordagens complementares e, por vezes, tensas no estudo do discurso.

*Hugo Dumoulin. Les théorisations du discours de Michel Pêcheux et Michel Foucault à la lumière du concept d’énonciation. Philosophie. Université de Nanterre - Paris X, 2022.

Do avesso


 

Para 2025



Chega um novo ano, e com ele, o desejo de ajustar os ponteiros internos. Para 2025, minha maior meta é simples, mas profunda: viver um dia de cada vez. Sem ficar preso ao passado, que já não posso mudar, e sem alimentar a ansiedade sobre um futuro que ainda não chegou. Quero estar presente, aproveitar o tempo que tenho, porque é no aqui e agora que a vida realmente acontece. Parece óbvio, mas não é fácil – exige atenção, escolhas conscientes e, sobretudo, paciência comigo mesmo.

Também quero cuidar mais do corpo e da mente. Comer de forma mais saudável, retomar os exercícios e me lembrar de que meu bem-estar não é algo que posso adiar. No trabalho, minha meta é buscar o equilíbrio: nem me sobrecarregar, nem me acomodar. Fazer o necessário com dedicação, mas sem perder de vista que a vida não pode ser resumida a metas de produtividade. Quero ser mais contido com o dinheiro, planejar melhor e evitar gastos desnecessários, mas sem transformar isso em um peso.

Por fim, 2025 será o ano de me abrir mais para o mundo. Aceitar convites, sair mais de casa, ouvir mais e falar menos – porque ouvir é um ato de generosidade e aprendizado. Quero ser menos irritado com a burocracia da vida, afinal, nem tudo precisa ser perfeito para funcionar. E, acima de tudo, quero seguir em frente com leveza, encarando as imperfeições como parte do caminho. Não são metas grandiosas, mas são as que, para mim, fazem sentido agora. Que venha 2025, um dia de cada vez!

Da Série: Contos Mínimos

O tempo tinha feito seu trabalho: os gestos não se encaixavam mais, as palavras vinham pesadas e o espaço já não era feito de espera, mas de...