domingo, 22 de maio de 2011

Um pequeno retorno (texto)

Voltei! Na verdade nunca saí deste lugar, então como posso voltar se não fui? Se nunca fui. Fui, de certo modo, mas posso adiantar que estive por aqui durante todos esses dias, ainda que ausente. Ir, voltar, estar, nunca ter ido, pode até parecer meio confuso. Mas não é. 
A gente pode ir sem nunca ter saído do lugar ou pode sempre estar mesmo não tendo ficado por aqui. Ir sem arredar o pé ou ter ficado enquanto se ia. Fui e fiquei, fora e dentro, assim, sem qualquer contradição.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

domingo, 15 de maio de 2011

Ivan Lessa: Toda força a nossos gays mirins (texto)

Uma amiga me indicou o texto de Ivan Lessa. Bom ler alguém com essa compreensão.

Sobre o abaixo-assinado contra o "Kit Gay" nas escolas públicas do país

Não sou homem de abaixo-assinados. Assinei alguns, só de birra, e, em seguida, abaixei a cabeça e moitei. Toda ação comum me desestimula. Nelas não acredito. Que me apontem um abaixo-assinado que tenha funcionado no Brasil. Isso. Não tem. Pensei que deles estivesse livre.
Um veio me pegar aqui numa Londres onde apenas 35% das petições públicas chegam aos olhos e ouvidos das pessoas que decidem essas coisas – e olha que já é muito.
Nosso abaixo-assinado, e que me atingiu no meio da testa, vai logo dizendo a que veio e a quantas as coisas andam: “Somos contra o maior escândalo deste país, o KIT GAY (sic)” e é destinado à presidente da República Federativa do Brasil; Congresso Nacional do Brasil; Supremo Tribunal Federal e Assembleias Legislativas.
Quem redigiu o documento foi direto ao assunto. Lá está e limito-me a copiar: “Somos contra o maior escândalo deste país, o KIT GAY (sic). Não aceitamos que nossas crianças de 7,8,9 e 10 anos recebam esse tal de KIT GAY. Neste KIT GAY há 2 vídeos com o título Contra a Homofobia, mas na verdade nesses vídeos contém mensagens subliminares para as nossas crianças, induzindo-as à homossexualidade. Uma coisa é preconceito... Outra coisa é fazer apologia ao homossexualismo!!!”
O português é meio maroto, mas o recado é dado de bate-pronto. Na linha seguinte, o documento acusa o Kit Gay (deixaram de lado as maiúsculas escandalosas. Por quê?) de estímulo ao homossexualismo e incentivo à promiscuidade e à confusão de discernimento da criança sobre o conceito de família. Que família, “seu”? A garotada envolvida está no banheiro do colégio.
Prossegue o texto, citando como fonte não Julian Assange (que fim levou?) mas o Jornal da Câmara dos Deputados. Ao que parece, o primeiro vídeo mostra um garoto de 14 anos chamado Ricardo que, certa hora, vai ao banheiro urinar. Enquanto urina, Ricardo dá uma olhada para o lado e vê o pênis de seu amigo e se apaixona pelo garoto. Ao retornar para a sala de aula, a professora da classe chama o menino pelo seu nome (Ricardo), que é quando o mesmo cerra seus lábios, pois, segundo diz, em alto e bom som, que quer ser chamado de “Bianca”.
Algumas ponderações: Ricardo, ou “Bianca”, descobriu sua porção homossexual em questão de minutos talvez, nem mesmo chegando a buscar um nom de guerre mais original. Mais: como era o nome da professora? E do amigo cujo piu-piu mudou a vida de Ricardo/”Bianca”? Muito importante: o que havia de especial na troncha do amigo da mijadinha escolar? E ainda: terá a professora exclamado para seus botões, “Bianca! Audácia do jovem bofe!”
No outro vídeo (consta que o diretor de ambos optou pela anonimidade), duas meninas lésbicas de aproximadamente 13 anos (como é que a petição sabe? Idade de mulher ou menina engana muito) serve de exemplar para outras (colegas? Lésbicas também? Heterossexuais? Que colégio é esse?). O vídeo mostra, e não sei como, a profundidade que a língua de uma menina deve entrar na boca da outra no decorrer do que já foi chamado de “ósculo sáfico”. Ouvi em algum lugar que, se der jeito e havendo condição, o ideal é 8cm. Mas capaz de ser exagero do pessoal.
O abaixo-assinado frisa que os vídeos (ou Kit Gay) já se encontram em fase de licitação (sempre um mau sinal) para serem distribuídos em todas as escolas estaduais e municipais de todo – conforme chamam – PAÍS. E finaliza o documento: “Uma coisa é preconceito, outra coisa é APOLOGIA AO HOMOSSEXUALISMO.” (Ei, abaixo-assinado, é DO e não AO. Ninguém aí foi ao colégio? Nem para fazer pipi ao lado do amigo anônimo do Ricardinho?)
Não assinei por uma questão de princípio e de fim também. Nem o garoto nem as meninas me parecem críveis e a professora não pode ser mais incompetente. Sem falar do fato que há um questionário com 6 quesitos a serem preenchidos.
Mas tenho uma sugestão. Dar à garotada que está jogando no outro time, por sinal cada vez mais o time de cá, nomes mais apropriados, como se faz com casal de bonecas, Ken e Barbie, por aí. Poderia ser Kit Gay (o guri) e Kitty Gay.

Domingo merece poesia

Agora o braço não é mais o braço 

erguido num grito de gol.

Agora o braço é uma linha, um traço,
um rastro espelhado e brilhante.
E todas as figuras são assim:
desenhos de luz, agrupamentos de pontos,
de partículas, um quadro de impulsos,
um processamento de sinais.
E assim - dizem - recontam a vida.
Agora retiram de mim a cobertura de carne,
escorrem todo o sangue, afinam os ossos
em fios luminosos e aí estou
pelo salão, pelas casas, pelas cidades,
parecida comigo.
Um rascunho,
uma forma nebulosa feita de luz e sombra
como uma estrela. Agora eu sou uma estrela.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Da Série Contos Mínimos


Dia desses, me mudei para uma cidadezinha muito fria do interior de um estado do sul do meu país. Lá, além desse frio imenso e de uma forte neblina que toma as ruas da cidade, pela manhã avisto, da janela do meu escritório, uma pequena casa de madeira em que uma velha senhora, apesar de todo esse frio e de toda aquela neblina que toma as ruas dessa pequena cidade, sai, a cada manhã, com um balde em punho molhando as plantinhas de um quintal baldio atrás dessa tal casa de madeira. Um cheiro de terra molhada invade a minha lembrança. Meu coração fica do tamanho da cidade, cheio até a boca da saudade que sinto do cheiro de minha terra. Por aqui um cheiro de mato toma conta no fim dos dias de parte de minha casa. Um exílio de aromas que meu olfato não recordava. Lá o cheio é outro: são buzinas, são cores, são pessoas que invadem essa memória olfativa.

Da Série Contos Mínimos


Acordou atordoado. De cara não reconheceu o lugar no qual se encontrava. Pensando bem, nem passados alguns minutos se deu conta de onde estaria. Branco demais. Fechado demais. Muito quente. Sentiu apenas que estava em movimento. Vezinquando sentia-se jogado de um lado para o outro. Passos. Cachorro latindo. E a sensação de estar passando por um funil. Uma voz anunciou: Carteiro! E caiu fundo num ambiente ainda mais fechado. Tudo era silêncio e escuro. Ficou dias a espera de novidades. Nada aconteceu. Conclui que o destinatário não se encontrava mais naquele endereço. Nunca mais se achou.

Uma aposta que se perde!

A gente aprende a lidar com a ausência quando só há ausência. Se a presença é escassa, se não há reciprocidade, se é preciso implorar a comp...