domingo, 26 de agosto de 2012

Tango pra Teresa (Evaldo Gouveia/Jair Amorim)


Hoje, alguém pôs a rodar Um disco de Gardel 
No apartamento junto ao meu 
Que tristeza me deu
Era todo o passado lindo 

A mocidade vindo 
Na parede a me dizer 
Para eu sofrer
Trago a vida agora calma 

Um tango dentro d'alma 
A velha história de um amor 
Que no tempo ficou
Garçom, põe a cerveja sobre a mesa 

Bandoneon, toque de novo que 
Teresa 
Esta noite vai ser minha e vai dançar
 Para eu sonhar
A luz do cabaré Já se apagou em mim 

O tango na vitrola 
 Também chegou ao fim
Parece me dizer  

Que a noite envelheceu 
Que é hora de lembrar E de chorar

sábado, 25 de agosto de 2012

Quem ama não "mata" (texto)

"Matei por amor". Foi o que disse em sua defesa, o playboy conhecido por Doca Street, quando foi preso depois de matar em Búzios, em 1976, a socialite Ângela Diniz.
Derrubando a reles defesa, as mulheres conseguiram inscrever na história e colocar nas primeiras páginas de todos os jornais da época, a frase: "quem ama não mata." 
Ela ficou famosa, e foi título de minissérie da TV em 1982, peças teatrais, discussões em colunas sentimentais, e até tema de tese de doutorado.
Schopenhauer afirmou que "todo amor que não é compaixão é amor-próprio". Não dá, né (?), para, em nome do amor, justificar as nossas atitudes? Sobretudo se elas são egoístas.
"Eu te bato porque eu te amo", ou ainda, "eu te traí porque eu te amo".
Obrigado, mas não quero um amor desse jeito. Em nome do amor, devíamos pensar antes de agir. Quando a gente ama alguém a gente deveria pensar em como o outro se sentiria diante do que a gente vai fazer.
Não é assim que a gente age quando compra um presente para alguém? A gente se coloca no lugar dela(e) e pensa na felicidade do outro, com a boa surpresa. Isso é amor!
O amor não é imune. Ele não está acima de tudo ou compreende qualquer coisa. O amor não é cego. Aprendi com o Erik (um grande amigo) que a gente não tem todo o tempo do mundo para resolver os nossos conflitos, porque as pessoas não estão a nossa disposição.

Perfume Siamês (Altay Veloso/Paulo Feital)


Perfume Siamês

Mas que prazer te rever, que bom te encontrar
Ah! Nesses anos a vida te fez remoçar
Não, não precisa fingir, nunca foi o teu forte fingir pra agradar
Pra mim o tempo passou, mas vamos sentar e sair da calçada
Sem colarinho e com fé, que é pra gente esquentar
Uma porção de filé e um conhaque do bar
Não, nunca vou me mudar, é a mesma casinha onde fomos morar
vê se vai me visitar, as coisas continuam no mesmo lugar
O salgueiro que você plantou
De chorar quase morreu, resistiu e cresceu
Mas o cão adoeceu, sentiu sua falta demais
E a roseira lá de trás, deu rosa e concebeu, sem espinhos uma flor
que tem seu cheiro e o meu.
Garçom me traga mais dois que é pra comemorar
Traz um traçado depois que é pro santo agradar
Não, não perdi a mania, ainda durmo fumando
Ainda queimo o colchão
Claro que lembro do dia, em que quase morri
E ninguém me acordava.
Nossos retratos de amor, eu não pude rasgar
Quando você se casou, pensei em me matar
Tua loucura foi tanta, casar por vingança só mesmo você
Mas não perdi a esperança
As coisas continuam no mesmo lugar
O salgueiro que você plantou
De chorar quase morreu, resistiu e cresceu
Mas o cão adoeceu, sentiu sua falta demais
E a roseira lá de trás, deu rosa e concebeu, sem espinhos uma flor
que tem seu cheiro e o meu.
Pede a conta, meu amor
E volta pro que é teu.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Mil perdões (Chico Buarque)


Mil Perdões

Te perdoo

Por fazeres mil perguntas
Que em vidas que andam juntas
Ninguém faz
Te perdoo
Por pedires perdão
Por me amares demais

Te perdoo

Te perdoo por ligares
Pra todos os lugares
De onde eu vim
Te perdoo
Por ergueres a mão
Por bateres em mim

Te perdoo

Quando anseio pelo instante de sair
E rodar exuberante
E me perder de ti
Te perdoo
Por quereres me ver
Aprendendo a mentir (te mentir, te mentir)

Te perdoo

Por contares minhas horas
Nas minhas demoras por aí
Te perdoo
Te perdoo porque choras
Quando eu choro de rir
Te perdoo
Por te trair

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Por que eu escrevo?

Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse sempre a novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias.
 
Clarice Lispector
Eu tenho algumas manias, por exemplo, não consigo estudar se  a casa estiver desarrumada. Tudo bem, isto não é mania é transtorno obsessivo compulsivo (TOC), tenho que assumir.
Mas eu queria mesmo era falar de uma mania que adquiri em virtude do uso da internet: eu não posso ler um nome próprio que tenho que procurá-lo no google. 
Só para ter uma ideia dessa nova tara:  se estou lendo alguma notícia e nela aparece algum nome (completo), preciso imediatamente fazer uma busca nas redes sociais ou nas páginas do Google. Por exemplo, acabei de ler uma notícia no G1 sobre dois irmãos de Ohio, Estados Unidos, que tiveram a prisão pertétua decretada por terem assassinado um traficante de drogas em 1987. Fui atrás dos nomes dos dois irmãos. Em seguida, na mesma matéria, fui informado de que duas décadas e meia depois, uma mulher identificada como Mary Evans postou na rede social uma notícia sobre o ocorrido. Fui em busca tb desse nome.
O pior disso tudo é que eu não faço nada com o que encontro, preciso apenas buscar as informações  e me dou por satisfeito.
Dia desses a piração foi além do limite: estava eu relendo um texto teórico de análise de discurso (AD) francesa (O chapéu de Clémentis, de Jean-Jacques Courtine). Neste texto, o autor faz referência ao comunista Klement Gottwald e a uma fotografia cuja imagem é bastante significativa para a AD, fui atrás da tal fotografia até encontrá-la.
Não me sinto (muito) incomodado com essa necessidade, mas as vezes cansa.

O bandeirinha artilheiro (100 anos de Nelson Rodrigues)

Antigamente, o bandeirinha era um superfósforo apagado. Funcionava como uma espécie de gandula lateral. E era patético, era comovente, vê-lo correr atrás de uma bola e devolvê-la. Esse marmanjo, esse barbado tinha uma grandeza na humildade de suas funções. Com o profissionalismo, o bandeirinha passou a ter uma súbita importância. Na pior das hipóteses, era um gandula remunerado. Continuava correndo atrás da bola, mas estava ganhando 25 mil-réis por jogo.

Passa-se o tempo e, de uma maneira insidiosa, macia, o bandeirinha deixou de ser aquele são Francisco de alpercatas. Tinha voz ativa. Já não era recrutado entre os pés-rapados, os borra-botas do esporte. Vejamos: quem é o bandeirinha em nossos dias? Juízes de primeira categoria e, numa palavra, sujeitos qualificados, que entendem de futebol, de regra, que dão palpites a torto e a direito. Mas nunca, em toda a história do futebol carioca, brasileiro e mundial, houve um caso como o do Fla-Flu de anteontem.

Amigos, o cronista esportivo é o cidadão mais convencional do mundo. Quando um time vence outro, o cronista repete, textualmente, o que vem dizendo desde a Guerra do Paraguai: "Vitória merecida". Nunca lhe ocorreou a hipótese, ainda que tênue, ainda que vaga, de uma vitória imerecida. Não. E mesmo quando o derrotado apresenta muito mais jogo e foi traído por um golpe de azar, o comentarista de futebol fala na "maior objetividade do vencedor". Ainda agora, no último Fla-Flu, o jornalista especializado finge não perceber a superioridade tão nítida do Tricolor.

Por que venceu o Flamengo e por que perdeu o Fluminense? Para a imprensa, o Rubro-negro foi mais objetivo e dominou no segundo tempo. É, como se vê, a imagem desfigurada do clássico. Até uma zebra no Jardim Zoológico perceberia a influência capital que teve, no resultado, um dos bandeirinhas. Mas a crônica não toma conhecimento deste fato sem precedentes ou, melhor, não atribui a este fato inédito uma importância fundamental.

Amigos, pela primeira vez, em toda a minha experiência futebolística e, mais do que isso, em toda a minha experiência terrena, eu vejo um bandeirinha artilheiro! Pois foi o que aconteceu no Fla-Flu. Um bandeirinha decidiu o jogo e com que tranqüila e arrepiante desenvoltura! Segundo o meu colega Nei Bianchi, o simpático auxiliar de juiz tem o apelido de "Caixa Econômica". Ele é "Caixa Econômica", como poderia ser "Banco de Crédito Real de Minas Gerais", "Banco Boavista S.A.", "Prolar".

Muita gente não foi ao campo e não pode formar uma idéia, mesmo aproximada, do que aconteceu. O fato é que, em dado momento, a bola chega ao bandeirinha e do bandeirinha parte para um jogador do Flamengo. O gol resultou, só e só, dessa intervenção que eu chamaria de sobrenatural. Toda a imprensa, com uma erudição marota, diz que, como o juiz, o bandeirinha é ponto morto. Ora, meus amigos, o senso comum é o que há de mais incomum. Porque se o árbitro da peleja possuísse um pingo de senso comum, teria achado o fato estranhíssimo. Das duas, uma: ou o bandeirinha estava fora do campo e a bola saiu, ou estava dentro do campo e, nesse caso, vamos perguntar: Por quê, senhores, Por quê?

Amigos, vamos falar de coração para coração, de consciência para consciência. Os jornais passam por alto sobre o episódio, citam o bandeirinha como um detalhe. Não entra na cabeça dos meus confrades que o bandeirinha não está ali para passear dentro do campo. O juiz é ponto morto porque está obrigado, funcionalmente, a permanecer no coração mesmo do jogo. Mas o bandeirinha que, sem quê, nem para quê, entra em campo e serve de tabela, está praticando uma óbvia, uma clara, uma escandalosa ilegalidade. Escrevem os meus confrades que a lei não menciona a hipótese. E daí? Não menciona, porque a coisa é evidente por si mesma.

Na ocasião, o Flamengo estava vencendo por 1x0, graças a um tiro de Henrique, desferido com incrível felicidade. Mas o Fluminense, muito bem armado, seguro de si e do jogo, perseguia o empate. E, súbito, vem o magistralíssimo passe do bandeirinha, passe tão exato, preciso, perfeito, que faria Didi, ou Zizinho, ou Domingos da Guia estourar de inveja. Enfim, uma coisa é certa: se as coisas continuam assim, hei de ver, em futuro próximo, bandeirinhas cobrarem pênaltis e correrem, com Pelé, no páreo dos artilheiros.

Nelson Rodrigues, 1959

Da séria: Contos mínimos

A conversa era narcísica. Ele me dizia o que eu queria ouvir porque amava ser amado. Havia um time de futebol apaixonado por ele e havia goz...